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terça-feira, 24 de abril de 2012

REFORMAS

A mania nacional tem sido reformar o ensino. Cada ministro, uma reforma. Sem recuar muito no tempo, na década de 30 o brasileiro tinha um ginásio de cinco anos. Terminando este, submetia-se a exames para as faculdades, caso quisesse. O ministro Francisco Campos bolou uma reforma, séria, de que abaixo se tratará.

Estando ministro, Gustavo Capanema implantou nova reforma: quatro anos de ginásio, três anos de científico ou clássico. Concluídos, o jovem buscava, se lhe apetecesse, os exames de ingresso nas escolas superiores. A reforma Capanema, ela mesma, foi reformada com acréscimo e supressão de disciplinas. Nela meteu-se o espanhol, dela tirou-se o espanhol. Depois, chegaria a vez de abolir o francês. Introduziram-se a organização social e política do Brasil e educação moral e cívica. E assim por diante, até que a estudantada desembocou na reforma Jarbas Passarinho, com a ensinança do primeiro e do segundo grau, ora em vigor. Ensino profissionalizante mas ninguém vai nessa profissionalização, porque todos querem o anel de doutor, mesmo sem mercado de trabalho.

A melhor reforma do país foi, de fato, a do ministro Francisco Campos. Cinco anos de ginásio, para a base humanística. Em seguida, o futuro profissional definia-se por um dos três ramos de preparatórios: o pré-juridico, o pré-médico ou pré-técnico.

O pré-jurídico, por exemplo, era constituído de disciplinas necessárias ao bacharel em direito: estudavam-se biologia, sociologia, economia política, higiene, história da filosofia, literatura, latim - e assim o estudante ingressava na faculdade com excelente soma de conhecimentos. Antes do ingresso, havia o vestibular - não o vestibular de testizinhos, mas de provas escritas em que realmente se podia mostrar competência.

Nos tempos de hoje se diz que a guerra dos vestibular parece mais terrível do que a guerra entre árabes e judeus, pois esta é uma guerra de violentos choques e do vestibular se torna guerra psicológica, donde os vencidos promanam frustrados, como se estivessem marginalizados do processo social brasileiro.

Há candidatos aprovados que não acreditam na vitória, e contam que se inscreveram para experimentar, jogar o barro na parede - uns chegam a confessar que nada estudaram. Um canja o sistemazinho de testes e suas pândegas opções. As editoras brasileiras já fazem enciclopédias de testes para vestibular. Hoje se espalham pelo Brasil doutores em preparativos de testes. E não está longe o tempo em que os universitários terão cursos de doutoramento em arte de fabricar testes.

Os moços deixaram os livros, não lêem pois consideram desnecessário o estudo e a leitura. O doutor de amanhã sabe que tudo se resume em decifrar testes. Melhor a revista de quadrinhos e o livro de bolso erótico e enaltecedor da violência. Machado de Assis passa a ser sujeito tolo que andou falando da vida alheia.

O teste naturalmente suplantou a cultura, em todas as suas manifestações.


A. Tito Filho, 08/06/1991, Jornal O Dia, p. 4

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