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sábado, 19 de maio de 2012

AINDA GOVERNO E LIVRO

No governo Hugo Napoleão se estabeleceu o Projeto Petrônio Portella, para edição de obras sobre o Piauí e de autores piauienses, numa homenagem ao político que tanto engrandeceu a terra natal, figura impressionante, cujas leituras lhe aformosearam o espírito e a inteligência. No início da vitoriosa carreira, chegou a publicar atos de violência, porque o Piauí ensinava que na violência estava a defesa contra os adversários. Sentimos em Petrônio, quando já ministro o visitamos, mais de uma vez, que cada dia mais ele se compenetrava do papel da cultura, a fim de guiar os homens nos caminhos certas da vida. Maduro e prestigiado nos altos escalões republicanos, não guardava ódios, nem queria malquerenças, vivia de fazer o bem. Deu lições aos maiores parlamentares brasileiros, na tribuna do Congresso Nacional. Sentia tão profundo gosto pelas cousas do saber que autorizou a feitura, na gráfica do Senado, de edições sucessivas dos grandes discursos parlamentares proferidos ao tempo do Império, o que lhe valeu a Medalha Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras.

O Projeto Petrônio Portella mereceu execução louvável do secretário Jesualdo Cavalcante, da Cultura. Excelentes livros se distribuíram no Piauí e no Brasil.

O governo seguinte, de Alberto Silva, prestigiou a obra cultural do antecessor. Mantiveram-se as normas do Projeto Petrônio Portella, confiado ao jornalista Kenard Kruel, esforçado e trabalhador.

Em agosto de 1987, o governador Alberto Silva, convocou a Academia Piauiense de Letras para participar desse auspicioso plano editorial. Acertou-se que os recursos se dividiriam entre a Casa de Lucídio Freitas e a Fundação Cultural do Piauí, meio a meio. As edições ficariam subordinadas às duas partes: à primeira, as obras de escritores desparecidos ou vivos considerados úteis ao conhecimento da história piauiense, ou outras, como trabalhos de ficção de autores desaparecidos ou acadêmicos; à segunda competia editar a literatura de novos escritores.

Desnecessário, asseverar que o Projeto Petrônio Portella fracassou na metade do governo Alberto Silva, porque os órgãos responsáveis pelas finanças necessárias ao custeio das edições fugiram, quase todos, dos compromissos publicamente adotados, recusando o pagamento das contribuições. Não lhes interessava senão a politiquice e o desprezo as manifestações culturais da terra.

X   X   X

O filósofo Marcuse ensinou que a sociedade possui três forças de comando: a econômica, a política e a intelectual. A primeira tem a primazia no comando e a ela se subordinam as outras duas. O detentor de grandes cabedais, os donos do poder, os escritores são os tipos que desfrutam de menos prestígio na vida social. O homem se torna escravo do dinheiro e com o vil metal compra mandatos. Satisfaz-se com esses triunfos. Os outros seres humanos contentam-se que os semelhantes lhe rendam homenagem e consideração por intermédio da autoria da obra literária ou de outro conteúdo.

Ao Projeto Petrônio Portella chegavam livros e mais livros de autores de uma triste subliteratura, as mais das vezes, todos apadrinhados ou amanhados. A Academia Piauiense de Letras recusava publicação e arrecadava inimigos. Kenard Kruel achou mais conveniente guardá-los nos arquivos respectivos, pois inclusive a editoração não era possível, uma vez que raros os órgãos governamentais que permaneciam no cumprimento do acordo assinado e chancelado pelo governador em 1990, um só centavo chegou às entidades encarregadas da execução editorial. O mesmo se deu ao brilhante Hardi Filho, sucessor de Kenard.

Morreu, tristemente, o Projeto Petrônio Portella.

O novo governo não pode fechar os olhos para a triste situação cultural do Piauí.


A. Tito Filho, 27-28/01/1991, Jornal O Dia - p. 4

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